Gedicht
Rui Cóias
ALEXANDRES`S TRAVEL TO INDIA
You wandered an interminable life across the earth,suffered exile, piteous jealousy, futile faith,
labour-arrested lovers plundering your beloved’s face.
You saw traces of having been no one’s shadow,
impudent eyes, the reflection of iron on the rampage,
hints of Alexander’s puerile dominance, contemplating Gaugamela.
You set off from a transient port towards the Levant,
leaving emptiness behind, seeing all of time,
and in the first Winter, by the cardinals of its ashes,
you started the endless crossing, the incessant history.
You knew, because the pine tree of youth can be glimpsed through tears,
of the shattered name in a cloudy mood measured without ropes,
and of the favourable sea breeze in the second Winter.
In exchange you pursued that which rules the fortuitous man,
whispering in marble palaces that are but stones,
failures to which no one had ever knelt.
By the third Winter you discovered the hemisphere, and by the fourth,
non intent on war or order to change the kingdom,
you chose to adorn aqueducts with the mantle of streams,
sitting by the pool breeze, in the evening´s lingering fever.
Whomever you approached, in their indefinite path,
without a place except that which fades inside a patchy mind,
in that which branches out and becomes the very web,
has spread with you the duty to pass through everywhere.
And by the fifth Winter, and the sixth, you stitched up the blood,
brought the skin on to the river bends, welcomed that which falls apart,
and were at last capable, with the belief of a stealthy migrant, of understanding
that all is lost yet in another place, and after this in yet another
and that by the end of each morning in another morning
all is uncertain, just like a dandelion in a field of wheat,
as muted as the exhausted vein of the unburied.
In the attic where night and day roam
the wind replies, cutting the chalk and the rye, and the candle,
shimmering in the light of the veiled stars already gone,
trodden, voiceless, swallowed up by the seventh Winter,
spears the heart and the ruin — the meridians undress, fly away
in twenty five years that were just kissing yesterday, and be it told or untold
the pleasure that brings a peak of torment, inflicted
by lips that only women know
in the turmoil of Varanasi´s death waters,
tests the flame of the merit, endurance and song of
the beginning and the end of your power on earth.
© Translation: 2017, Ana Hudson
A VIAGEM DE ALEXANDRE À ÍNDIA
A VIAGEM DE ALEXANDRE À ÍNDIA
Andaste de um ao outro lado da terra na vida interminável,tiveste degredos, piedosos cíumes, a fé desvanescida,
amantes paradas na lavoura, roubando-te o rosto amado.
Viste vestígios de que foste a sombra de ninguém,
olhos sem pudor, do reflexo dos ferros no tropel,
franjas do domínio pueril de Alexandre, olhando Gaugamela.
Partiste num porto de transição para o Levante,
com vazios para trás, todo o tempo a poder ver,
e ao primeiro Inverno, pelos cardeais das suas cinzas,
começaste a travessia que não termina, a história que não acaba.
Soubeste porque se vislumbra, em lágrimas, o pinheiro da juventude,
o nome quebrado num turvo ar medido sem corda,
e a maresia do vento de feição no segundo Inverno.
Em troca perseguiste o que rege o homem fortuito,
segredando em palácios de mármore que são apenas pedras,
dos fracassos a que jamais alguém ajoelhara.
Ao terceiro Inverno descobriste o hemisfério, e ao quarto,
sem ideia de guerra ou ordem para mudar o reino,
escolheste adornar os aquedutos sob o manto dos regatos,
sentado, na brisa no tanque, ao febril entardecer.
De quem te aproximaste, no seu trajecto interminado,
sem lugar senão o que esfria na mente recortada,
naquilo que se ramifica, tornando-se na própria teia,
contigo propagou o dever de passar em toda a parte.
E quando veio o quinto Inverno, e o sexto, suturaste o sangue,
trouxeste a pele à curva dos rios, acolheste o que de resto se desmorona,
e pudeste enfim, na crença dos migradores furtivos, entender que
tudo se perde noutro lugar ainda, e após esse ainda noutro
e que ao fim de cada manhã noutra manhã
tudo é incerto, tão conforme o dente-de-leão no meio de searas,
tão emudecido como a veia exausta dos não sepultados.
Na mansarda onde vagueia o dia e a noite
o vento responde, cortando o centeio e o calcário, e a vela
que brilha na luz de estrelas veladas, já desaparecidas,
pisadas, mudas, engolidas aos pés do sétimo Inverno,
arpoa o coração e a ruína — os meridianos despem-se, voam
em vinte e cinco anos que há pouco se beijavam, e seja dito ou não dito
o prazer que inflige um pico de tormentos
por lábios que só as mulheres conhecem
no moinho das águas da morte em Varanasi,
sacode a chama de quanto vale, dura e canta
o princípio e o fim do teu poder na terra.
© 2016, Rui Cóias
From: Europa
Publisher: Edições tinta-da-china, Lisbon
From: Europa
Publisher: Edições tinta-da-china, Lisbon
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A VIAGEM DE ALEXANDRE À ÍNDIA
Andaste de um ao outro lado da terra na vida interminável,tiveste degredos, piedosos cíumes, a fé desvanescida,
amantes paradas na lavoura, roubando-te o rosto amado.
Viste vestígios de que foste a sombra de ninguém,
olhos sem pudor, do reflexo dos ferros no tropel,
franjas do domínio pueril de Alexandre, olhando Gaugamela.
Partiste num porto de transição para o Levante,
com vazios para trás, todo o tempo a poder ver,
e ao primeiro Inverno, pelos cardeais das suas cinzas,
começaste a travessia que não termina, a história que não acaba.
Soubeste porque se vislumbra, em lágrimas, o pinheiro da juventude,
o nome quebrado num turvo ar medido sem corda,
e a maresia do vento de feição no segundo Inverno.
Em troca perseguiste o que rege o homem fortuito,
segredando em palácios de mármore que são apenas pedras,
dos fracassos a que jamais alguém ajoelhara.
Ao terceiro Inverno descobriste o hemisfério, e ao quarto,
sem ideia de guerra ou ordem para mudar o reino,
escolheste adornar os aquedutos sob o manto dos regatos,
sentado, na brisa no tanque, ao febril entardecer.
De quem te aproximaste, no seu trajecto interminado,
sem lugar senão o que esfria na mente recortada,
naquilo que se ramifica, tornando-se na própria teia,
contigo propagou o dever de passar em toda a parte.
E quando veio o quinto Inverno, e o sexto, suturaste o sangue,
trouxeste a pele à curva dos rios, acolheste o que de resto se desmorona,
e pudeste enfim, na crença dos migradores furtivos, entender que
tudo se perde noutro lugar ainda, e após esse ainda noutro
e que ao fim de cada manhã noutra manhã
tudo é incerto, tão conforme o dente-de-leão no meio de searas,
tão emudecido como a veia exausta dos não sepultados.
Na mansarda onde vagueia o dia e a noite
o vento responde, cortando o centeio e o calcário, e a vela
que brilha na luz de estrelas veladas, já desaparecidas,
pisadas, mudas, engolidas aos pés do sétimo Inverno,
arpoa o coração e a ruína — os meridianos despem-se, voam
em vinte e cinco anos que há pouco se beijavam, e seja dito ou não dito
o prazer que inflige um pico de tormentos
por lábios que só as mulheres conhecem
no moinho das águas da morte em Varanasi,
sacode a chama de quanto vale, dura e canta
o princípio e o fim do teu poder na terra.
From: Europa
ALEXANDRES`S TRAVEL TO INDIA
You wandered an interminable life across the earth,suffered exile, piteous jealousy, futile faith,
labour-arrested lovers plundering your beloved’s face.
You saw traces of having been no one’s shadow,
impudent eyes, the reflection of iron on the rampage,
hints of Alexander’s puerile dominance, contemplating Gaugamela.
You set off from a transient port towards the Levant,
leaving emptiness behind, seeing all of time,
and in the first Winter, by the cardinals of its ashes,
you started the endless crossing, the incessant history.
You knew, because the pine tree of youth can be glimpsed through tears,
of the shattered name in a cloudy mood measured without ropes,
and of the favourable sea breeze in the second Winter.
In exchange you pursued that which rules the fortuitous man,
whispering in marble palaces that are but stones,
failures to which no one had ever knelt.
By the third Winter you discovered the hemisphere, and by the fourth,
non intent on war or order to change the kingdom,
you chose to adorn aqueducts with the mantle of streams,
sitting by the pool breeze, in the evening´s lingering fever.
Whomever you approached, in their indefinite path,
without a place except that which fades inside a patchy mind,
in that which branches out and becomes the very web,
has spread with you the duty to pass through everywhere.
And by the fifth Winter, and the sixth, you stitched up the blood,
brought the skin on to the river bends, welcomed that which falls apart,
and were at last capable, with the belief of a stealthy migrant, of understanding
that all is lost yet in another place, and after this in yet another
and that by the end of each morning in another morning
all is uncertain, just like a dandelion in a field of wheat,
as muted as the exhausted vein of the unburied.
In the attic where night and day roam
the wind replies, cutting the chalk and the rye, and the candle,
shimmering in the light of the veiled stars already gone,
trodden, voiceless, swallowed up by the seventh Winter,
spears the heart and the ruin — the meridians undress, fly away
in twenty five years that were just kissing yesterday, and be it told or untold
the pleasure that brings a peak of torment, inflicted
by lips that only women know
in the turmoil of Varanasi´s death waters,
tests the flame of the merit, endurance and song of
the beginning and the end of your power on earth.
© 2017, Ana Hudson
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